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A Parábola dos Talentos


“Porque isto é também como um homem que, partindo para fora da terra, chamou os seus servos e entregou-lhes os seus bens” (Mt.25.14).
O início da parábola nos faz pensar que a mesma dá continuidade a um tema mencionado anteriormente. De fato, a expressão “isto é também” liga esta passagem à parábola das 10 virgens, concluída no verso 13. O pronome demonstrativo “isto” se refere ao reino dos céus, que se manifestará em plenitude na segunda vinda de Cristo. (Compare Mt.25.1 com 25.14).
Jesus contou muitas parábolas relacionadas ao reino e à segunda vinda. Por quê tantas? Não seria repetitivo? O que acontece é que nenhuma parábola é suficiente para expressar toda a realidade espiritual. Então, o Mestre contava diversas. Cada uma demonstrava novos aspectos, conceitos e valores do reino.
Ele acabara de falar sobre as 10 virgens, mas precisava mostrar um outro lado da questão. Jesus deseja que tenhamos uma visão cada vez mais ampla sobre a sua pessoa, sobre o Pai, o reino de Deus, a segunda vinda, e sobre nós mesmos, nossa posição e responsabilidades.
A 1ª parábola mostra Jesus como noivo e nós, seu povo, somos representados pelas noivas, as 10 virgens. O relato se refere às bodas nupciais, uma grande festa.
A 2ª parábola mostra Jesus como Senhor e nós como servos. Não fala de festa, mas de trabalho.
IDENTIDADE: SERVOS
Nossa visão não pode estar focalizada em apenas alguns desses aspectos, mas em todos. O cristianismo deve ser visto sob a ótica do amor e do relacionamento, mas não podemos ignorar a obediência e o trabalho que o Senhor espera de nós. A igreja é noiva, mas não deixa de ser serva.
Queremos muitas bênçãos de Deus, e ele nos dá, mas não desejamos ordens ou proibições. Se somos servos, devemos assumir nossa posição de obediência. Não podemos ser exigentes com Deus nem determinar o que ele deve fazer. Atitudes como esta não combinam com a figura do servo.
A parábola fala sobre um senhor (um homem rico) que, antes de viajar para uma terra distante, chamou os seus servos (escravos) e lhes entregou os seus bens (Mt.25.14). Tal gesto demonstra a grande confiança depositada naqueles serviçais. O senhor podia ter deixado suas propriedades a cargo de pessoas de posição social elevada, como os banqueiros, mas não o fez.
Jesus estava se referindo a si mesmo. Ele é o Senhor que, dentro de pouco tempo, haveria de retornar à glória celestial, mas, antes disso, chamou seus discípulos e lhes deu poderes, prerrogativas e uma missão. Todos os cristãos, em todos os tempos, também receberam a vocação celestial. O Senhor é quem nos chama e também nos capacita, colocando em nossas mãos os bens necessários à realização da sua obra.
Ele entregou os bens nas mãos dos servos, mas não lhes “deu” os bens. Tudo continuava pertencendo ao Senhor (v.18). Os servos são apenas mordomos, dispenseiros, dos dons de Deus (ICo.4.1). Neste mundo, nada nos pertence. Afinal, nós também pertencemos a Deus. Todo servo é propriedade do seu amo. Não pertencemos a nós mesmos. Nossos bens, família, dinheiro, tempo e dons, tudo é do Senhor.
“Do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam” (Salmo 24.1).
“Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? (ICo.6.9).
Quando recebemos algo do Senhor, devemos ser gratos e responsáveis. Não se trata de uma doação, mas de um depósito. Não destrua o que Deus lhe entregou. Podemos usar, com zelo, não deixando que se perca aquilo que é de Deus. O melhor é que façamos bons investimentos para que o que recebemos seja multiplicado, sempre que possível. Tal propósito envolve muito trabalho. Precisamos trabalhar. É para isso que o servo existe.
Entendemos que aqueles servos seriam representantes do seu senhor enquanto ele estivesse viajando. Seriam seus procuradores, agindo em seu nome, fazendo negócios com os seus bens. De modo semelhante, a partir do momento que o Senhor Jesus foi assunto aos céus, os cristãos passaram a ser seus representantes. Isto é uma grande honra e maior responsabilidade. Representamos o Senhor neste mundo. Nossas palavras e ações podem honrar ou trazer vergonha para o seu nome.
Quando o senhor viaja muitos servos param de trabalhar. Querem apenas comer, beber, dormir e se divertir. Pode ser que alguns queiram fugir. Deus deseja que seus servos trabalhem.
A DISTRIBUIÇÃO
O Senhor deu cinco talentos ao primeiro servo, dois ao segundo e um ao terceiro, conforme a capacidade de cada um (Mt.25.15). Nosso conceito sobre o amor e a justiça divina talvez nos levasse a pensar que ele daria o mesmo a todos, mas não é assim. Em sua onisciência, ele já sabe o que cada um vai fazer com o que recebeu. Por isso, ele não desperdiça, embora não deixe de dar oportunidade a todos. Se Deus deu riqueza a um cristão, isto não significa que ele dará a mim ou a você. Não nos invejemos uns aos outros, mas procuremos trabalhar para a multiplicação daquilo que recebemos.
O que é um talento? Alguns responderiam rapidamente que Jesus estava se referindo aos dons, às habilidades naturais e/ou espirituais. Entretanto, o sentido literal do texto não se refere a isso. Um talento, nesse contexto, é dinheiro, um tipo de moeda grega, com valor correspondente ao pagamento de seis mil dias de trabalho numa vinha (aproximadamente 20 anos).
Podemos comparar os talentos a tudo o que o Senhor nos deu, inclusive dons, habilidades, etc, mas não podemos ignorar o sentido original do texto.
O CARÁTER DEMONSTRADO NA PRÁTICA
O servo que recebeu cinco talentos poderia ter ficado satisfeito, acomodado, mas não ficou. Trabalhou de tal forma que conseguiu um rendimento de 100% sobre a quantia inicial.
O talento não é um prêmio (ainda). Não é o fim, mas apenas o início de uma jornada. Podemos alcançar muito mais em nossas vidas e ministérios. Podemos crescer muito. Não fiquemos acomodados.
Em todas as conquistas do cristão, existe a parte divina e a parte humana. Deus deu cinco talentos e o servo conquistou mais cinco. Sem Deus nada seria possível, mas não podemos achar que ele vá fazer tudo sozinho. Em muitas áreas é assim: Deus começa e nós continuamos. Orar é importante, pedindo que Deus faça algumas coisas que não estão ao nosso alcance, mas trabalhar também é fundamental, de modo que façamos o que Deus espera de nós.
O servo que recebeu dois talentos poderia ter ficado satisfeito, ou até mesmo revoltado, vendo o que o primeiro recebera. Entretanto, ficou motivado para o trabalho e também conseguiu 100% de rendimento.
O que recebeu um talento ficou revoltado contra Deus (e talvez contra seus conservos também). Ele foi, então, e escondeu o dinheiro. Aquele homem também trabalhou. Ele cavou a terra, fez um buraco, colocou o dinheiro lá dentro e depois o cobriu. Ser infiel também dá trabalho (muito), mas não dá bons frutos. Alguém poderia pensar que aquele homem tenha sido zeloso, guardando o dinheiro, mas não era este o propósito do seu Senhor. Quando alguém recebe algo valioso, guardar é o mínimo que pode ser feito. Entretanto, Deus não quer que façamos apenas o mínimo. Precisamos fazer o máximo que pudermos. Em outras palavras, precisamos fazer o melhor.
(Por exemplo, algumas pessoas compram ou ganham uma bíblia e a mantêm guardada durante décadas, mas nunca a lêem. É um tesouro guardado e desperdiçado).
Daquele momento em diante, aquele servo ficou entregue à ociosidade. Como nós estamos? Temos escondido o nosso talento? Não podemos esconder o que o Senhor nos tem dado. Não podemos esconder a nossa mensagem. Devemos ser como um luzeiro, que a todos leva a sua luz.
Aquele homem sabia que o dinheiro não lhe pertencia. Esse conceito estava certo, mas sua atitude era errada. Se não é meu, por quê eu vou fazer multiplicar? Este é o raciocínio egoísta do mau servo, do mau empregado, do mau cristão. Trabalhe em seu emprego como se a empresa fosse sua. Trabalhe na igreja como se ela fosse sua. De fato, tudo pertence ao Senhor e não aos homens.
“Não atente cada um para o que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros” (Fp.2.4).
“Se no alheio não fordes fiéis, quem vos dará o que é vosso?” (Lc.16.12).
TEMPO DE TRABALHAR
“Muito tempo depois, veio o Senhor e fez contas com eles” (Mt.25.19).
O talento tem o seu valor, mas não podemos nos esquecer da importância do tempo. Geralmente, não o valorizamos. A demora do Senhor representa o tempo que temos para trabalhar. Este é o prazo que a igreja tem para realizar sua missão na terra.
Quem ainda não trabalhou, talvez tenha tempo para se arrepender e começar. O terceiro servo tinha apenas um talento. Ainda que começasse tarde, talvez ainda conseguisse 100% de lucro, mas deixou o tempo passar.
O RETORNO
Veio o Senhor...
Muitos pensam que Jesus vai demorar muito. Talvez, em relação ao dia de hoje, e por uma perspectiva humana, pode ser que ele demore. O problema é que, às vésperas de sua volta, muitos continuarão pensando que ele ainda vai demorar. Esse tipo de pensamento pode levar ao relaxamento. Supondo que ele vá demorar, ainda posso adiar o meu trabalho. Não faça isso, pois Cristo voltará num momento inesperado (Mt.24.45-51).
Há quem pense até que ele não virá mais (Ex.32.1; IIPd.3.4). Então muitos passam a viver desordenadamente.
Aqueles servos iam levando suas vidas. Dois trabalhavam. Um não trabalhava. De repente, veio o Senhor.
Jesus virá. Sua vinda é certa. Não sabemos quando será, mas devemos nos preparar como se ele fosse voltar em breve. De qualquer forma, se ele não vier rapidamente, nós iremos. Então, o trabalho é urgente, pois não sabemos quanto tempo ainda nos resta.
O DIA DO JUÍZO FINAL
“Veio o Senhor e fez contas com eles” (Mt.25.19).
Haverá uma prestação de contas, quando cada um deverá se apresentar diante de Deus e mostrar o fruto do seu trabalho. Que diremos ao Senhor? O que lhe apresentaremos?
O que recebeu um talento foi para o fim da fila (permita-me imaginar). O que recebeu cinco talentos se aproximou logo do Senhor e apresentou o relatório. Ele era ousado. Aquele que não trabalhou precisava se esconder, como fizera com o talento recebido.
Os servos trabalhadores apresentaram ao Senhor todos os talentos (v.20). Tudo deve ser entregue ao Senhor, porque tudo é dele. Cada um deles foi honrado e recompensado por todo o seu trabalho. Assim acontecerá com os cristãos fiéis, quando o Senhor voltar.
Disse-lhe o Senhor: “Bem está, certo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre o muito te colocarei. Entra no gozo do teu Senhor” (Mt.25.21). Observe que o Senhor disse “pouco”. Não precisamos murmurar diante da quantidade recebida. Por mais que tenhamos recebido, Deus sabe que é pouco, pois ele tem infinitamente mais para nós. Não nos ensoberbeçamos nem murmuremos pelo pouco que temos.
O valor de um talento é muito dinheiro para um trabalhador (20 anos de salário). O que dizer então de 5 talentos? Corresponde a 100 anos de salário. Para mim, é uma fortuna. Entretanto, o Senhor disse que tudo isso é pouco.
Sejamos gratos, fiéis e trabalhadores. Neste mundo, recebemos apenas uma pequena amostra do que Deus tem.
Ele disse: “Entra no gozo do teu Senhor”. Isto é muito mais do que bens, muito mais do que talentos. É usufruir a própria presença de Deus por toda a eternidade.
O FRACASSO DE UM SERVO
Aquele que recebera um talento mostrou-se amargurado, revoltado, expressando um conceito errado sobre o Senhor, mostrando que não o conhecia bem. Pensava que o Senhor ia tomar todos os talentos quando voltasse. Afinal de contas, tudo pertencia a ele. Então, de que valeria o seu trabalho? Pensando assim, não trabalhou. Ele poderia até parecer esperto, mas foi surpreendido pelo Senhor, que não tomou os talentos dos dois servos que trabalharam.
É possível que os outros servos também pensassem que todos os talentos seriam recolhidos, mas, ainda assim, trabalharam fielmente. Parece que o Senhor surpreendeu a todos.
Foi dado a cada um o fruto do seu próprio trabalho. O que fazemos (ou deixamos de fazer) volta para nós mesmos. É a lei da semeadura e da colheita.
Quando chegou a vez do terceiro servo, o Senhor lhe tirou o talento e deu ao que tinha dez. Este acabou ganhando mais 20% sobre a quantia original. O Senhor tem muito mais para aqueles servos que trabalham. É algo além do resultado do trabalho. É abundância proporcionada pela bênção de Deus.
O terceiro servo perdeu tudo. O Senhor dá, mas ele também tira. Adão e Eva foram colocados no Paraíso, mas, por causa do pecado, foram expulsou de lá. Cuidado! Não tenhamos uma idéia ilusória sobre o amor e a graça de Deus.
O servo foi condenado por não ter trabalhado? O problema não está exatamente no dinheiro no trabalho, nas obras, mas na fidelidade que Deus espera. O erro estava no caráter e nas atitudes daquele homem. Ele se mostrou mau, infiel, negligente, preguiçoso, omisso, arrogante, atrevido, blasfemo e inútil.
ROTEIRO ALTERNATIVO
Os servos não tinham pleno conhecimento da situação que os envolvia. Nós também não temos.
As coisas poderiam ter sido bem diferentes se, no início da parábola, o Senhor tivesse feito uma reunião com os servos e lhes explicasse tudo:
- Para onde ele estava indo.
- O que iria fazer lá.
- Qual seria a data e a hora do seu retorno.
- Qual era o seu critério da distribuição diferenciada dos talentos.
- O que cada um devia fazer com o dinheiro (em detalhes).
- Qual seria a recompensa ou o castigo que teriam quando ele voltasse.
Se fosse assim, não haveria liberdade de ação para os servos nem surpresas no final. Cada um agiria, não com base no seu caráter, mas por causa do prêmio ou por medo do castigo. A missão não serviria como teste. Seria como entregar uma prova para os alunos juntamente com as respostas.
Não é o que desejamos, muitas vezes?
Aqueles servos sabiam apenas o seguinte: O Senhor viajou, mas vai voltar. Enquanto isso, nós devemos trabalhar.
Não vamos saber de tudo com antecedência, ainda que seja grande a nossa curiosidade. Nossos questionamentos nem sempre serão respondidos. Precisamos ser fiéis, mesmo sem ter todas as respostas. Confie no Senhor e prossiga no caminho. Abraão obedeceu a Deus e saiu sem saber para onde ia (Heb.11.8). Ele confiou e caminhou.
Questionamentos sem respostas podem ter efeito paralisante. O cristão questionador pode ficar parado (para não dizer empacado).
Pergunte menos e trabalhe mais. O Senhor sabe o que faz e nós devemos fazer o que ele manda, mesmo sem saber muitas coisas.
A CONDENAÇÃO
O texto termina dizendo: “Lançai o servo inútil nas trevas exteriores. Ali haverá pranto e ranger de dentes.” (Mt.25.30).
Este versículo parece falar sobre a condenação eterna de um servo do Senhor. Isto é duro de admitir, mas não consigo ver de outra forma. Aquele homem era, de fato, um servo, porém infiel. Ele não era um ímpio. E, se é verdade o que alguns acreditam, que o verdadeiro crente não pode se perder, então acabou a utilidade da parábola de Jesus. Pense bem.
Que tipo de servo nós somos? Bom e fiel ou mau e negligente?
Aquele servo inútil perdeu muito mais do que o talento. Perdeu a presença do Senhor, sendo lançado fora da casa (nas trevas exteriores).
O Senhor tem expectativas a nosso respeito. Fidelidade é o que ele espera de nós.

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